Page 134 - 9F O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO
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outra ala do hotel. Não que eu ligasse para isso. Estava deprimido demais para

               me preocupar se a vista do meu quarto era boa ou não. O empregado que me
               levou até o quarto devia andar pelos sessenta e cinco anos e conseguia ser mais
               deprimente do que o próprio quarto. Era um desses carecas que penteiam todo o
               cabelo do lado por cima da cabeça para tapear. Eu preferia ser careca de uma vez
               a  fazer  um  troço  desses.  De  qualquer  jeito,  que  emprego  fabuloso  para  um
               sujeito de sessenta e cinco anos: carregar a mala dos outros e ficar esperando
               uma gorjeta. Acho que ele não era muito inteligente nem nada, mas o troço não

               deixava de ser doloroso.










                      Quando ele foi embora, fiquei olhando pela janela, ainda de paletó e tudo.
               Não tinha nada de melhor para fazer. Aí é que reparei o que estava acontecendo
               do outro lado do hotel. Não se davam nem ao trabalho de baixar a veneziana. Vi
               um sujeito de cabelos grisalhos e ar muito distinto, só de cuecas, fazendo um
               troço  de  cair  o  queixo.  Primeiro  pôs  a  mala  em  cima  da  cama.  Aí  tirou  uma
               porção de roupas de mulher e começou a vesti-las. Roupa de mulher mesmo:

               meias de seda, soutien e uma dessas cintas com elásticos, pendurados e tudo. Aí
               se enfiou num vestido de noite preto, justo pra chuchu. Juro por Deus. Depois
               ficou andando pra lá e pra cá, no quarto, com uns passinhos miudinhos assim
               como as mulheres fazem, fumando um cigarro e se olhando no espelho. E o pior
               é que estava sozinho, a não ser que houvesse alguém no banheiro - isso não dava
               para ver de onde eu estava. Quase em cima da janela dele, um homem e uma

               mulher  estavam  se  encharcando:  cada  um  esguichava  um  bocado  de  água  em
               cima do outro. Talvez fosse uma bebida qualquer, e não água, mas não dava para
               saber o que estava nos copos. Seja lá o que for, ele tomava um gole e esguichava
               em cima dela toda, e aí era a vez dela fazer o esguicho em cima dele. Dou minha
               palavra de honra, os sacanas se revezavam. Era um troço digno de ser apreciado.
               O tempo todo pareciam uns histéricos e riam como se estivessem fazendo a coisa
               mais engraçada do mundo. Não estou brincando, não, o hotel estava repleto de

               tarados. Acho que, provavelmente, eu era o único sacana normal nas imediações
               - e isso não é lá muita vantagem. Me deu uma vontade bárbara de passar um
               telegrama  para  o  Stradlater,  mandando  ele  tomar  o  primeiro  trem  para  Nova
               York. Ele ia ser o rei do hotel.
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