Page 241 - 9F O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO
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qualquer num auditório enorme. Colombo. Eles viviam mostrando à gente o
Colombo descobrindo a América, e dando um duro danado para convencer o
velho Fernando e a Isabel a emprestarem a grana para comprar os navios, e
depois os motins da tripulação e tudo. Ninguém ligava muito para o pobre do
Colombo, mas a gente sempre levava uma porção de balas e chicletes e outros
troços, e o auditório tinha um cheiro muito gostoso. Sempre cheirava como se
estivesse chovendo lá fora, mesmo quando não estava, e a gente se sentia como
se estivesse no único lugar bonito, seco e gostoso do mundo. Eu adorava aquela
droga daquele museu. Me lembro que a gente tinha que passar pelo Salão dos
Índios para chegar ao auditório. Era um salão muito comprido e a gente só podia
falar aos cochichos. A professora ia na frente, a turma atrás, formando duas
colunas. Cada um de nós tinha um companheiro e eu quase sempre ficava ao
lado de uma menina chamada Gertrudes Levine. Ela vivia o tempo todo
segurando a mão da gente, e a mão dela era sempre pegajosa ou suada ou sei lá o
quê. O chão era todo de pedra e, se a gente levava umas bolas de gude e deixava
cair uma de repente, a danada saía quicando como o diabo pelo salão, fazendo
um barulho infernal. Aí a professora parava o pessoal e voltava para ver o que é
que estava acontecendo, mas nem por isso ficava zangada. Aí a gente passava
por uma canoa de guerra dos índios, comprida pra chuchu, do tamanho de uns
três cadilaques juntos, com uns vinte índios dentro - uns remando, outros sem
fazer nada, fazendo pose de machão, mas todos com pintura de guerra. Lá atrás,
sentado, tinha um cara estranho, com uma máscara de meter medo. Era o
curandeiro. Ele me deixava arrepiado, mas eu até que gostava dele. Outra coisa:
se a gente punha a mão num dos remos ou noutro troço qualquer, um dos
guardas dizia logo:
- Não peguem em nada, crianças.
Mas sempre com uma voz simpática, não como uma droga dum tira nem