Page 395 - 9F O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO
P. 395
levei-a à cidade para fazer compras comigo. Nos divertimos pra chuchu. Acho
que foi na Loja Bloomingdale. Fomos na seção de sapatos e fizemos de conta
que ela - Phoebe - queria um par dessas galochas altas, dessas que têm mais ou
menos um milhão de casas para passar o cadarço. O vendedor quase ficou
maluco. A doida da Phoebe experimentou uns vinte pares, e cada vez o infeliz
tinha que amarrar um pé até em cima. Era o tipo da maldade, mas a Phoebe se
divertiu barbaramente. Afinal, compramos um par de mocassins e mandamos pôr
na conta. O vendedor até que foi muito simpático. Acho que ele sabia que nós
estávamos só de brincadeira porque a Phoebe fica rindo o tempo todo.
De qualquer modo, continuei andando toda a vida pela Quinta Avenida,
sem gravata nem nada. Aí, de repente, começou a acontecer um negócio um
bocado fantasmagórico. Cada vez que eu chegava ao fim de um quarteirão e
descia o meio-fio, tinha a sensação de que nunca chegaria ao outro lado da rua.
Pensava que ia caindo, caindo, caindo, e nunca mais ninguém ia me ver. Puxa,
fiquei apavorado pra burro. Ninguém imagina o medão que me deu. Comecei a
suar como um filho da mãe, molhei toda a camisa, a roupa de baixo, tudo. Aí
comecei a fazer outro troço: cada vez que chegava ao fim do quarteirão, fazia de
conta que estava falando com o meu irmão Allie. Dizia pra ele: "Allie, não me
deixa desaparecer. Allie, não me deixa desaparecer. Por favor, Allie." Aí então,
quando chegava do outro lado da rua sem desaparecer, eu agradecia a ele. Logo
que chegava a outra esquina, começava tudo de novo. Mas continuei andando
assim mesmo. Acho que estava meio amedrontado de parar - nem sei direito,
para dizer a verdade. Sei que só fui parar quando já estava lá pela altura da rua
Sessenta e tantos, pra lá do Jardim Zoológico. Aí, sentei num banco. Quase que
não conseguia respirar e ainda estava suando como um filho da mãe. Acho que
fiquei sentado lá mais ou menos uma hora. Finalmente, decidi ir embora de vez.
Resolvi que não voltaria para casa nunca mais, e nunca mais iria para colégio
nenhum. Decidi que ia só encontrar com a Phoebe, para me despedir e tudo, e
devolver o dinheiro de Natal que ela me havia emprestado. Aí começaria a viajar
para o oeste, pegando caronas nos carros. Já sabia o que tinha de fazer: ia até o
Túnel Holland e apanhava uma carona, depois pegava outra carona, e depois
outra e mais outra. Assim, em poucos dias já estaria lá pelo oeste, num lugar